Depois de quatro anos, gigante da tecnologia decidiu manter cookies de terceiros no Chrome. Para mercado, ainda há dúvidas sobre o que significa a mudança de rota.
Durante quatro anos, pairou sobre a indústria da publicidade a sombra da decisão do Google de eliminar os rastreadores online usados para personalizar anúncios a partir do Chrome, o navegador mais popular da internet. A previsão era que o fim definitivo dos cookies de terceiros acontecesse ainda este ano, até que a gigante de tecnologia anunciou, nesta segunda-feira, que voltaria atrás da decisão.
Em comunicado publicado em seu blog, o Google diz que vai adotar uma abordagem em que os usuários vão ter o poder de decisão sobre compartilhar os dados de navegação nos sites do Chrome, mas não deixa claro exatamente como fará isso. A big tech também ainda afirma que vai discutir como os desenvolvedores e a indústria de publicidade participarão dessa nova saída para os cookies, sem dar novos prazos para isso.
Criados no início da década de 1990 por um engenheiro da Netscape, um dos primeiros navegadores da web amplamente utilizados, os cookies são pequenos pedaços de código que deixam rastros da navegação dos usuários. O sistema representou um avanço para aperfeiçoar a usabilidade da internet, ao permitir que os sites memorizassem preferências, como idioma e login, e também virou uma ferramenta poderosa para identificar perfis e direcionar anúncios de forma personalizada.
Parte do mercado celebrou a reversão do fim dos cookies, mas a indústria de publicidade e anúncios digitais ainda aguarda mais definições sobre o que irá significar essa nova abordagem do Google.
Um dos pontos relevantes, e ainda incertos, é como será a prática da empresa para permitir ao usuário final tomar a decisão sobre os rastreadores, o que poderá definir o nível de alcance que os cookies de terceiros ainda terão.
Amanda Gasperini, diretora de Analytics, Growth & Martech da Gauge, consultoria digital do Grupo Stefanini, avalia que o anúncio é “mudança de rota” no plano da empresa para por fim aos cookies, mas avalia que o mercado ainda deve seguir o processo de revisitar estratégias, diante da perspectiva de que as práticas da big tech vão passar por revisão.
— A visão estratégica de que uma mudança no uso de dados vai acontecer e deveria
continuar por parte da indústria. O anúncio do Google sinaliza para outro caminho que eles
vão adotar. Mas as mudanças (nos cookies) vão acontecer. A diferença é que agora não é
mais tão alarmante — diz Gasperini.
A volta atrás gerou surpresa para parte do mercado de publicidade e anúncios digitais, mas
não foi completamente inesperada, já que o Google vinha de uma série de adiamentos para
o momento em que colocaria fim aos cookies. A previsão inicial, divulgada pela empresa em
2020, era de que o fim dos rastreadores de terceiros aconteceria há dois anos.
Nesse tempo, anunciantes, agências digitais e consultorias de marketing passaram a buscar alternativas para a publicidade direcionada que depende desses dados, mas com temor do efeito que o fim dos cookies do Chrome traria para o mercado.
— O movimento da indústria foi de fortalecer os próprios dados para conseguir trabalhar com a perspectiva de fim dos cookies. Mas essa não é uma jornada fácil, é bastante trabalhosa — diz Natália Fernandes, cofundadora da consultoria Plexus Cloud.
Para o IAB Brasil, entidade que representa o mercado de publicidade digital, “ainda é muito cedo” para tirar conclusões sobre as novas práticas do Google. Em comunicado, a organização recomendou que o anúncio da big tech não levasse a um “retrocesso” no trabalho na gestão de dados e priorização de informações primárias.
Os sinais de mudança no mercado de cookies vêm de alguns anos, na esteira de leis de proteção e privacidade como a Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) da União Europeia (UE), que passou a valer em 2018. Diante do aperto regulatório, o Google prometeu acabar com os rastreadores no Chrome, enquanto a Apple se antecipou. Desde 2020, em um processo amplo de medidas de proteção de privacidade, a empresa impede o uso dos cookies de terceiros no Safari.
— Não é só o fim dos cookies pelo fim dos cookies. Essa era uma mudança (na forma como o mercado lida com dados) que vinha também em razão das novas questões de privacidade, com a LGPD, por exemplo. Todo mundo foi tendo que se adequar — afirma Rogério Salgado, fundador e diretor da Agência Explorer.
Carlos Pereira Lopes Filho, diretor de Tecnologia da Monks Brasil, diz que o caso da Apple, em 2020, foi a primeira lição para indústria sobre o impacto do fim dos cookies de terceiros, o que levou a redução da performance de empresas na entrega de anúncios. Ele pondera que, apesar da indústria de publicidade ter buscado alternativas nos últimos anos, o mecanismo ainda é relevante para uma parte importante da cadeia de publicidade:
— É o caso da mídia programática (compra automatizada de anúncios digitais) e de remarketing (estratégia que exibe anúncios a usuários que já visitaram um site), que ainda se apoiam em cookies de terceiros, por exemplo. A interrupção, pelo Google, faria com que os ajustes tivessem que ser feitos mais rapidamente.
Apesar dos outros navegadores já barrarem o uso, o Chrome é o mais usado do mundo, com mais de 60% de participação no mercado. Em alguns países, como o Brasil, esse percentual é ainda maior – chega a 77,89%, segundo a consultoria Statcounter. É por isso que, apesar da abordagem de concorrentes que já barraram os rastreadores, o mercado acompanha com lupa as mudanças que virão do Google, assim como os reguladores.
Nesta terça-feira, logo depois do anúncio, o ICO, órgão regulador do Reino Unido, lançou um comunicado em que dizia estar “desapontado” com a volta atrás da empresa e indicava que iria continuar a monitorar “como a indústria irá responder”. Em seu blog, o Google afirmou que está discutindo “o novo caminho” com reguladores e que irá se envolver com a indústria “à medida que o implementamos”.
Fabro Steibel, diretor executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS Rio), lembra que o Google vinha tentando desenvolver uma alternativa para os cookies de terceiros desde que anunciou que iria bloqueá-los no Chrome. Em uma iniciativa chamada de Privacy Sandbox, a empresa vinha testando uma série de ferramentas alternativas ao uso dos rastreadores para a segmentar de anúncios:
— O que a decisão desta semana indica é que a solução que estavam propondo no Privacy Sandbox não foi tão boa ou que eles encontraram novos obstáculos, como um risco de concentração ainda maior de marcado.
Fonte: https://epocanegocios.globo.com/empresas/marketing/noticia/2024/07/cookies-o-que-a-reviravolta-do-google-significa-para-a-industria-de-publicidade-e-anuncios-online.ghtml